MEMÓRIAS DE 2013

Páginas  do Meu Diário ( 1º Semestre)

Terça-feira, 8 de Janeiro de 2013 (Miratejo, 09/01 02:25h)

“À espera do milagre”

As sombras da noite, as insónias que me invadem o espírito, o silêncio que me percorre o sangue. Deito-me, apago a luz, mas falta-me fazer algo. A meu lado não tenho ninguém. Comigo só mesmo este livro. Escrevo, escrevo sobre ele as memórias do que sou. A morte aguarda-me no escuro e, por isso, fico acordado, à espreita. A mágoa, o amor perdido. Choro, mas porquê? Por quem? Rasgo-me por dentro. Estou farto de ser vítima. Acorda homem! No entanto, não durmo. Olho em volta e apenas sombras, espíritos que me envolvem e me acusam de ser inerte, sem vida, sem paixão. Sonhos e mais sonhos de vida, sem vida. Projectos de amor, de paz, de família; e uma ponte ruiu mesmo por debaixo dos meus pés. Iludi-me no caminho. Errei na estrada. Sofro então por meus filhos, mas levanto-me para lhes dizer que estou bem, que estou feliz, que continuo a ser um homem de sorte, com o mundo todo à minha volta para viver. Não se preocupem. “À espera do milagre” é um filme estranho, de formas estranhas: os crimes que não cometemos, as penas por que passamos e pagamos. A luz, a vida, a paixão, o amor. Quero dormir, mesmo sobre a cama, apenas com um cobertor por cima, como uma mortalha. Quero viver em paz para morrer em paz com todos. Sim, o amor traiu-me e deu-me uma lição. Choro com ela, sofro muito com ela, mas não há mais nada a fazer. Estou no corredor verde e parece que nunca mais chega ao fim. Deus, estás a ouvir-me?
 
Carlos Alberto

Terça, 15 de Janeiro de 2013 (Miratejo, 23:00h)
“A raiz ao pensamento”

Parece que nada acontece e a vida se aborrece. Acordamos com alegria para que o dia nos sorria. Cantamos uma canção mesmo que só cantarolando para animar as hostes dançando e sambando. E na cozinha com tachos e panelas, à farinha, ovos e açúcar nos atiramos, um bolo tentamos fazer e nem que seja experiência ganhamos. E no ar ficou um cheiro a algo que no fogão se queimou, mas mesmo assim saboroso o bolo se foi e acabou. Portanto, meus amigos, há mais para além da vida e do facto de não ficar nada, experiencia-se a feitura de algo (um bolo) e no fim recebemos obrigada. Porque a felicidade nos transcende, tudo nos pode passar ao lado, portanto, mesmo que a mão emende, amanhã será outro fado. Tenho também o gosto de escrever, da escrita; no entanto, não consigo bem viver, mas com a força bendita invicta tudo pode acontecer. Sei que valho pouco, tenho pouca capacidade, mas o gosto de estar aqui ninguém me tira e por esta vontade e felicidade irei até ao fim da minha vida. É certo que é importante termos o eco do que escrevemos, mas mesmo com o pouco que sabemos temos a satisfação de nós mesmos. E aqui fica um resumo diferente, longe do que imaginei, mas significa o que se sente, mesmo que não seja nada do que pensei. As palavras são ditas com a alma e coração e ficam aqui para sempre gravadas com a força da minha paixão. E porque quero ser feliz é como se fossem a raiz.

Carlos Alberto  
 
Sexta-feira, 18 de Janeiro de 2013 (Miratejo, 23:10h)

“Nos caminhos do sucesso”
Acreditamos que é possível. Pode não ser fácil, mas estamos no caminho certo. A força unida jamais perderá a esperança. E caminhamos, assim, juntos nessa batalha contra o mal. Somos uma equipa à procura de uma identidade e sabemos estar, como já estivemos em repastos de reis, sentados em mesas de nobreza. No entanto, o clima é agreste. Quase que apetece não sair de casa. Desafiar a intempérie é outra afronta. Mas saímos e ali chegados somos quase vinte mil. Vinte mil vozes em uníssono. Há um momento que quase caímos por terra. Como foi possível chegar-se tão baixo? E sofremos. Quando devíamos estar a glorificar-nos, eis que o diabo nos bate à porta. Atónitos, nem acreditamos. Não tivéssemos nós do nosso lado um santo Patrício e estaríamos a carpir mágoas e a desejarmos não sermos de quem somos, desta estirpe sofredora que parece que gosta de ser chicoteada, masoquista, que gosta de sofrer. A chuva cai impiedosa. Parece que o mundo vai desabar. Mas o milagre acontece. Sorrimos à sorte e vaiamos o diabo que se tinha posto à espreita. Um Cosme de camisola amarela que entortava aquilo, como que manietado, que nós queríamos direito. Não, não nos molhámos No aconchego das bancadas varridas a vento e salpicos de chuva pudemos sorrir do milagre e saborear uma vitória arrancada a ferros. E demos graças a Jesualdos e a Patrícios por termos saído mesmo que só com o pecúlio mínimo no bornal. Mas foi o quanto baste, depois de um sofrimento quase atroz. Saímos felizes da contenda e regressámos a casa, mesmo que não seja à beira-mar. Obrigado, rapazes, apesar de pequenos. E viva o Sporting.

Carlos Alberto

Quarta-feira, 06 de Fevereiro de 2013 (Miratejo, 20:25h)
“Tantas, tantas voltas”

As férias já lá vão, mas continuamos a sentir a nostalgia desses dias que ainda perduram no nosso imaginário, a despeito da distância. E seguem-se os reflexos desses tempos, as emoções, os sentimentos, as palavras que se exprimem, os desejos subjacentes que se incorporam, as mensagens que se transcrevem. E estamos no meio de um desabar de sentidos, com emoções ao rubro. Escrevemos poesia e dizemos o que sentimos: agradecemos o amor, enaltecemos a solidariedade, louvamos a amizade levada ao extremo. E ficámos lá. Agora é a vida real, aquela que nos paga, aquela que nos faz viver todos os dias do ano. Esquecemos o passado, acordamos e saímos para a rua. Há trabalho à nossa espera. Aprendemos. Criamos espaço para aceitarmos o conhecimento que se atravessa no nosso horizonte. Passam os dias, as semanas, os meses e nós já nem nos apercebemos da velocidade com tudo passa. Foi no outro dia e já lá vai um ano. O tempo, esse tempo infinito que se esgota para todos. E não vale a pena esperar porque ele nos rouba tudo, a começar pela juventude. Temos tantas ilusões e, num instante, já não estamos aqui. E já estou até a ver alguém a ler esta página e eu já no outro lado do mundo, na zona dos espíritos e a rir-me da ilusão que tinha quando escrevi estas linhas. Construímos tanta coisa e afinal tudo se resume a um leve sopro que tudo sacode a atira abaixo. Mas é bom ter ilusões. Acreditarmos no amor, que nada é fruto do acaso e para estarmos aqui o mundo deu tantas, tantas voltas. E aqui estamos a sorrir...
Carlos Alberto


Quarta-feira, 13 de Fevereiro de 2013 (Miratejo, 14/02 01:40h)
“A escrever”

Escrevo à noite, escrevo ao tempo, escrevo à solidão. Só sei que escrevo, não a quem ao certo, se a todos, não sei, não. Escrevo nem sequer sei o quê, para quê, que. Que raio de conjunção. Eu quero, mas não sei. Só sei que escrevo. Sim, à noite, noite adentro, com a noite como companhia. Triste, sim, muito triste de estar só e cada vez mais só, que até mete dó. Prometi, no entanto, a mim mesmo escrever só alegrias, falar de sorrisos, de pombas brancas a esvoaçar, sem me lamentar. Escrever como coisas boas, mesmo as que sejam más para que pareçam lindas e que a todos satisfaz. A noite é escura, mas posso sempre acender a luz. Lá fora os homens do lixo recolhem os caixotes, mas agora é tudo feito à base de automatismos, sem archotes. E eu estou aqui a ouvi-los, deitado, de luz acesa para ver o que escrevo. Sim já com óculos novos. Estou feliz por ter óculos novos. Mesmo que tenha passado o dia a “gritar” com toda a gente porque os queria muito. Não consegui controlar-me. Peço desculpa agora, nesta hora. Parei para fazer sopa. Comi três tigelas logo de seguida, de vento em popa. Até estou mal disposto, com um nó no estômago. Mas se calhar não foi da sopa, mas do bolo de iogurte que estive a fazer e que comecei a comer sem o deixar arrefecer... Pois, aí esqueci a raiva. Sozinho, sozinho em tudo para tudo, coitadinho. Um feliz infeliz que escreve à noite para o tempo, o sonho, a ilusão que espreita e o sono que se esquece e nem arrefece. Quero sorrir à noite, ao vento, às sombras que aqui estão. Não queria estar sozinho, não. Mas estou. Estou no lugar que mereço, enfiado entre cobertores. Mas não estou a recolher o lixo, lá fora, nem sob a intempérie. Estou aqui a escrever sem tremer.
Carlos Alberto


Segunda-feira, 18 de Fevereiro de 2013 (Miratejo, 19/02 00:40h)

“Na hora dos aflitos”
Nada para fazer, nada para dizer, tudo para acrescentar. A vida, a hora, o sentido, a luz. Palavras que se escrevem apenas para se honrarem compromissos. Como uma espécie de interlúdio antes que cheguem as grandes decisões. A escrita, esse mundo estranho de letras que se juntam e que formam palavras. E estas até podem ser de ódio ou de amor. E a propósito: neste momento estou numa fase em que não sinto amor especial por alguém, além, claro, dos meus filhos e irmãos. Os tios estão longe, nunca me ligaram nenhuma. Os primos estão todos bem na vida e também se afastaram, cada um na sua. Mas quem ao certo se afastou de quem? Pois, restam as palavras. Sonhos que tornamos realidade nua e crua, como na vida. Há montanhas, ratos, Natais, meninos e meninas e há palavras por dizer: ovos, sopa, bolos para comer. Há a cozinha, o tempo que sobra das palavras e nos dispõe. Que bom que é ter na mesa a sopa que confeccionámos: as batatas, as ovas, ovos e cenoura, tudo cozido e regado com um bom azeite e que preparámos. No fim, como sobremesa, ainda há um bolo de iogurte, cada vez mais perfeito. Fome? Já não passaria fome. As conversas com as palavras estão assim a ficar para trás. Só os traumas não. Tenho ainda raiva e acho que vou tê-la até ao último suspiro da minha vida: alguém me roubou a felicidade que tinha e deitou-me para o lixo. Alguém me abandonou achando que tinha muito melhor ali mesmo ao lado, à mão de semear. Deixou-me na lama, a apodrecer. E da lama estou ainda a tentar sair, mas às vezes atolo-me e sofro angustiado pelas palavras que gostava de escrever e que não sou capaz. Sinto-me frustrado pelo que sou e pelo que me tornei. Até quando?
 
Carlos Alberto

Segunda-feira, 11 de Março de 2013 (Miratejo, 19:00h)
“No silêncio das palavras”

Acordo para um novo dia, mas sem esperança de que ele me possa trazer algo de novo. Não tenho nada para fazer e o meu espírito esvazia-se nesse mesmo momento. Todavia, levanto-me, visto-me e saio de casa. Levo uma revista debaixo do braço para ler. Na rua, o clima está péssimo. Chove a potes e empunho na mão um guarda-chuva. No entanto, a manhã já quase passou. Aliás, o tempo esgota-se a um ritmo impressionante. Não damos conta e até ao que nos rodeia ficamos absortos. Chega assim depressa a hora do almoço e na mesa “redon”, além da célebre sopinha que já foi a melhor do mundo. Depois, computador e porcarias. Porcarias e computador. Enquanto isso, a tarde avança, intrépida, fria e chuvosa também. Um pouco de leitura para encher o tempo cinzento. Meia dúzia de minutos com a minha filha mais velha, de manhã e depois do almoço. Ela ainda trabalha. É das poucas pessoas que ainda tem trabalho neste país cada vez mais miserável. Foge-me a tarde. Passo pela padaria e trago pão quase quente para o lanche/jantar. Há mais sopa para comer onde incluo um naco de chouriço de cebolada que a minha irmã me vai oferecendo. (a razão porque gosto cada vez mais dela). Delicio-me. Sabe-me muito bem. E cai a noite, impiedosa. O meu sossego quebra-se com a porta da rua a abrir-se. Já não estou só aqui em casa, mas preferia. A companhia não me trás alegria. Há momentos em que estar só vale mais que mil pessoas juntas. O ruido instala-se e eu preferia o silêncio dos meus ecos, a cor da minha sombra, as luzes do meu torpe pensamento. Sobram-me as fotos de viagens de ontem e de sempre: o meu tempo, o meu espaço. Estar comigo mesmo.
Carlos Alberto

 
Quinta-feira, 25 de Abril de 2013 (Miratejo, 26/4 01:10h)
“Pelo meu país”

Os foguetes ecoaram noite dentro, meia-noite, madrugada da libertação. As vozes do povo ergueram-se e cantaram a liberdade numa canção. As pessoas saíram à rua e os cravos espigaram na ponta das espingardas. Foi uma festa, a alegria, a vitória dos oprimidos sobre os opressores, contra os horrores. Acabaram os presos políticos. Os contestatários foram todos libertados, uma nova canção nasceu, seja em Grândola, seja em Lisboa, nada aconteceu à toa. A minha pátria voltou a sorrir, a minha voz voltou a ouvir-se e já não fui para a guerra e vi-a sumir-se. Aqui e na minha terra, Santarém ou no Terreiro do Paço, a fera sucumbiu ao cansaço. Estive no Camões que se encheu de poetas e esvaziou de ladrões. Lembro-me das fardas da GNR, militares perfilados, em parada, armados até aos dentes, e eu imberbe, de arma na mão, mal sabia o que fazia, não. Não sabia. Acabar com a guerra colonial, salvar o meu país, Portugal, e na fúria de vencer, vi o povo a meu lado erguer, e o medo, o terror de morrer se perdeu, o povo saiu à rua e venceu. Pela noite dentro e durante o dia fui soldado, numa História que nunca se viveria, não fossem homens como Salgueiro Maia, idolatrado. Ainda me lembro naquela noite, acordado, da parada para o anfiteatro em que nos disse ”amigos, vamos salvar Portugal, acabar com a guerra colonial”. Uma noite fantástica e memorável aquela, em cima de uma camioneta, rumo a Lisboa pela madrugada fora soando aquela canção de vitória, ouvida no silêncio, com paixão e alegria contida no medo do que estaria por vir. E de manhã, na aurora de uma novo dia, nascia um país novo que pela pátria morreria. Foi há trinta e nove anos, parece que foi ontem.

Carlos Alberto

Sexta-feira, 21 de Junho de 2013 (Torre da Marinha, 22/6 01:45h)
“E deixa-nos a noite”

Escrevo à noite, ao que resta dela, ao silêncio deste quarto, na penumbra da luz que me inspira. São os sentidos da alma, a nostalgia da escrita, o momento imediatamente antes de me deitar para baixo, de deixar cair a cabeça sobre a almofada, deixar-me ir na onda dos sonhos e descansar. É a hora de dizer até amanhã. Hora, no entanto, de deixar primeiro o testemunho, a mensagem de que houve vida, há vida e também paz. Sim, há tudo isso, mas falta algo: falta o amor; e esse só existe aqui nas palavras que transcrevo. Na minha alma há, no entanto, essa frustração. Não fui capaz de cativar, de guardar para mim algo que eu merecesse, esse carinho essencial à vida dos seres. Mas não foi só aí que falhei. Não fui capaz de muita coisa, não fui suficientemente competente. Por outro lado, achei sempre que o tinha sido, que procurava ser melhor em tudo o que fazia, mas afinal estive enganado o tempo todo e errei nos meus critérios de avaliação. Todavia, “o bem não está perdido”. Encontro então, na esquina, a gratidão de outra gente que me apoia e ajuda e me dá um pouco do ânimo de que preciso. Pode até ser um encontro de trabalho, mas até isso é bom e reconfortante nos tempos que correm, tão difíceis estão os dias de hoje para a maioria das pessoas. E afinal não somos o centro de nada, como pensávamos, a não ser de nós mesmos.  Sim, é bom ter trabalho. É bom sair de casa e cinco minutos depois estarmos sentados num escritório à secretária, diante de um computador. Como seria bom para mim que o trabalho fosse permanente, que tivesse a ajuda que preciso. Mas infelizmente, não é assim, tudo é temporário. E resta-me aqui nesta noite silenciosa escrever e o sentir da minha respiração que agora se acalma e preparar-me, enfim, para mais uma deliciosa noite de sonhos...

Carlos Alberto

 PS: Fiz, como habitualmente, ligeiríssimas alterações muito pontuais nalguns textos. Por outro lado dizer que estes resumos são páginas manuscritas que estão lá para trás no tempo e valem o que valem. “Não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe”.

Comentários

  1. Partilhar é bom. Faz bem à alma.
    Abraço

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    1. Obrigado Maria do Sol pelo comentário. Sim, e estas serão as melhores páginas publicáveis dos primeiros seis meses do ano transacto. A alma pode ser pequena, mas é "alma".

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